Finalmente, o Belcanto!
Digo finalmente porque já tenho o voucher comprado desde fevereiro, já estive para ir no meu aniversário, e só no sábado passado é que lá fui!
Se há uns tempos me dissessem que este era um dos tópicos da minha lista "coisas a fazer antes de morrer", eu dizia que vocês estavam loucos. Algum dia... Mas a vida dá muitas voltas e agora não podia deixar de constar na lista!
Finalmente, consegui um dia em que eu e o A. estivéssemos livres e lá viemos rumo a Lisboa.
Após uns demasiado longos minutos à procura de estacionamento, lá conseguimos um relativamente perto e, à hora de abertura do restaurante, já estávamos à porta! (Nós tínhamos reserva, calma, mas a minha vontade era tanta que acabámos por chegar um pouco antes)

Fomos recebidos por uma menina super simpática, que nos levou até à sala de refeição.
A sala tem uma decoração simples e clássica, mas com alguns twists que tornam a sala muito interessante (Adorei a parede de pratos meios derretidos, com luzes por trás)

(fonte: www.joseavillez.pt) (Não tirei fotos da sala, desculpem)
Fomos levados para a mesa e rapidamente começou a nossa aventura gastronómica.
Começámos por um conjunto de elementos "explosivos": um tremoço, uma azeitona , uma cenoura e um alho. Pelo, menos eram o que pareciam. Mas, tal como o empregado explicou, isto apenas se assemelhava a essas coisas. Só devíamos ter cuidado ao pegar nos elementos, pois eram elementos super frágeis e sensíveis (eu, que tenho uma delicadeza de uma pedra, imaginem o meu pânico).
Coloquei o tremoço (na foto à direita) na boca e aí percebi o conceito da explosão de que falavam... Aquilo rebenta na boca e sai um molho super fresco que derrete na boca! Não consegui identificar qual o sabor, mas não me pareceu tremoço. Mas olhem, eram bom!
Continuámos com a azeitona e esta foi a minha preferida! Porque, depois de explodir, o molho era forte e intenso, com um extremo sabor a azeitona verde. E eu, que adoro azeitonas, imaginem a minha felicidade...
Seguimos para a cenoura que, para minha surpresa, não sabia a cenoura, mas sim a caril (só não percebi de quê).
E para finalizar, a crosta do alho soube-me a chocolate branco mas amargo (se é que isso é possível, ou se era apenas o meu psicológico) e o creme tinha um ligeiro sabor a alho, muito agradável!
Não podíamos ter começado da melhor maneira, com a surpresa quase de ovo Kinder do estilo "o que vai sair daqui?", em que sentias uma crosta da textura de chocolate a derreter na boca, e um molho super saboroso que envolve a nossa boca numa extrema felicidade!
Continuando no mundo das entradas, somos presenteados com uma panóplia de pratos lindos, super apelativos ao olhar! Desde um rio, passando por um jardim, e acabando numa espécie de capoeirinha, que engraçado!
Começámos pelas "pedras do rio" que, mais uma vez, seguiam o conceito das primeiras entradas e, com jeitinho, lá peguei na pedrinha e ela explode na boca e sai um sabor a mar, tão fresquinho, salgado na dose certa (possivelmente do caviar).

Passámos para um vasinho de flores super fofo, mas confesso que não tinha descoberto ainda o que era para comer... Que raio, seriam as flores? As folhas não podiam ser porque eram artificiais... Então, olhei com mais atenção e descobri uns pequeninos cones lá escondidos, que não eram mais que tártaro de atum envolvido num cone super super estaladiço, a lembrar as batatas fritas, ligeiramente salgado também, tão bom (eu sou suspeita, prefiro mil vezes salgado ao doce). Nunca tinha comido tártaro de atum (algo quase igual a atum cru) mas era super fresco, com o sabor característico a atum, muito interessante!

De seguida, provámos o frango assado, que a mim me lembrou um pratinho com uma mini capoeira lá dentro. Os pormenores no empratamento e na decoração do prato, bem... Sensacional! O mini prato soube-me à pele do frango, crocante e super saboroso. O patê era o dito frango assado, mas confesso que não consegui descobrir o que era o verde... Mas posso dizer-vos com certeza que o sabor estava lá! Não exactamente o de frango de churrasco, mas muito semelhante! Patês super cremosos (quais grumos, qual quê!), que contrastavam na perfeição com a pele super estaladiça.

Terminámos este rol de entradas com uma sopa fria de milho, que foi servida num copo pequenino, quase de shot. A sopa era super fresca, com um ligeiro travo agridoce (lembrou-me o cebolinho) e com um sabor intenso a milho. Não foi a entrada que mais me agradou, mas lá está, não somos todos iguais e com certeza que terá havido clientes que adoraram esta entrada em primeiro lugar! Posso dizer-vos que a nível de cremosidade era muito boa!

Fomos depois presenteados com a "Janela do Submarino", que retratava na perfeição o fundo do mar! Uma miríade de bivalves do nosso mar, mergulhada num gel transparente que lembrava tão bem a água do mar! Lamento dizer-vos que não descobri o que era o gel branco que acompanhava os bivalves, mas mal não me soube! E pasmem-se, não deixei nenhum dos meninos de fora! Por isso, quase que vos garanto que polvo ou lula foi comido por mim, e não me queixei! É certo que não é, de todo, o meu prato preferido (cada vez vejo que sou mais de carne que de marisco...), mas os elementos eram super tenrinhos, fresquinhos e com intenso sabor a mar! O mexilhão surpreendeu-me porque o seu sabor me lembrou um pouco a noz (se a memória não me falha...), e nunca o tinha provado assim.

A parte das entradas terminou e pudemos provar o típico pão com manteiga, mas elevado a outro nível! Provámos três manteigas diferentes: Manteiga tradicional dos Açores, Manteiga de farinheira com tomate seco, e Manteiga Defumada.
Mais uma vez, destacar a cremosidade de cada uma delas e a cor... que bonita paleta! Quanto a sabor, a primeira era a típica manteiga, com o seu sabor suave e muito agradável. A segunda foi a minha favorita (ou não fosse eu adepta dos enchidos!), com o sabor forte a farinheira (da salgada, não da doce) que era acompanhada do doce e ácido do tomate. Que casamento perfeito! A última foi a que mais me surpreendeu, porque tinha um sabor tão diferente do que já tinha comido. É difícil de explicar: Sabia a manteiga normal, mas com um intenso sabor a fumo, mas não, não era estranho. Era agradavelmente diferente!
Não tirei fotos ao pão, mas podíamos escolher entre pão de trigo sarraceno, de quinoa, de azeitona, broa de milho e baguette clássica. Comi de todos menos da baguette e gostei de todos! Mas o que me ficou no coração foi o de trigo sarraceno. Quentinho, crocante por fora e sedoso por dentro, tão bom!

Passámos aos pratos principais e começámos pela interpretação do chef da "Horta da galinha dos ovos de ouro". Ovo cozido a baixa temperatura constante, com uma folha de ouro comestível, cogumelos e crocante de pão. Ora ovo de qualquer maneira, para mim está bom! Este era muito agradável (mas não a minha forma preferida), que era impecavelmente complementado com o crocante salgado do pão e o sabor super suave dos cogumelos. Quanto à folha de ouro comestível, não me pareceu ter grande sabor, mas que causa impacto, causa!

A seguir, voltamos à praia e damos um "Mergulho no mar", com o filete de robalo cozido em água salgada pela cozedura dos bivalves que o acompanham. O peixe acompanha com algumas algas do nosso mar. Bem, nunca tinha comido um peixe tão suculento, tão macio, parecia veludo! Desfazia-se na boca como se derretesse... Divinal!

Continuando nas nossas raízes portugueses, o chef presenteou-nos com o típico cozido à portuguesa, mas à sua maneira: cebolas bebés, com um pouco de gordura (penso que da barriga do porco), com cenouras bebés, hortelã e couve. Mais uma vez, destaco a suavidade da carne de porco que, apesar de ser uma parte mais gorda, em nada se notava no sabor. É um sabor bastante diferente do cozido à portuguesa que costumo comer em casa (não há nada como o de casa...), talvez por causa da hortelã, que tem um sabor intenso. Mas é sempre bom abrir os horizontes e conhecer novas formas de cozinhar o mesmo prato, mas em zonas diferentes do nosso país.

E eis que chega um prato cuja zona nos fica tão próxima: Leitão à Bairrada. Confesso que fiquei um pouco desconfiada porque leitão é na Bairrada, em mais lado nenhum! Mas como podem ver, os elementos são completamente diferente do que vemos cá para cima.
O chef utilizou os mesmos elementos do prato típico mas transformou-os numa versão super moderna: A laranja foi transformada num molho de laranja e alho negro, a alface transformada num coração de alface grelhada, as batatas continuam a ser batatas mas pasmem-se, o saco é comestível! Não sei que ingrediente seria, mas poderia jurar que era gelatina neutra, pois derretia na boca e não tinha grande sabor. Mas que nos deixa desconfiados, deixa! (Ainda pensei que o empregado estava a brincar, mas afinal não!)
O leitão, bem como podem ver, vem assado e leva um molho que eles dizem ser o típico usado na Bairrada. Aí lamento desapontar mas em nada tem a ver com o molho que se usa cá em cima. O molho costuma ter a pimenta preta bastante pronunciada, para cortar um pouco do "doce" e a untuosidade do leitão (a laranja também ajuda a cortar essa gordura). O molho servido era muito suave, diria eu que sem pimenta nenhum. Atenção, o molho era muito bom e caía muito bem com o leitão, mas em nada tem a ver com o típico que acompanha o leitão, na Bairrada.
Para mim, a estrela do prato foi o molho de laranja. O leitão estava sedoso, com a pele estaladiça como se espera. A alface tinha um sabor muito agradável. Mas o molho, meus meninos... O molho era qualquer coisa! Eu que, por si só, já sou mega fã de citrinos, então provar um molho que derretia na boca, super cremoso, quase espuma, a saber a laranja docinha com um travo salgado do alho... Tão mas tão bom! Vejam só a textura dele, dá para ver que é super fino e não tem ponta de grumos!

Chegámos à parte final das sobremesas, onde nos aparece na mesa um pudim de abade de priscos com sorvete de framboesa e wasabi, e torresmos doces.
Soa a mixórdia? Sim.
Sabe a mixórdia? Nem de perto nem de longe!
A conjugação dos sabores, o contraste entre o pudim extremamente doce com o sorvete ácido e fresco... Os torresmos pareceram-nos ser pipocas super estaladiças e os pedacinhos rosa pareceu-me ser framboesa desidratada. Felizmente, o wasabi não estava muito presente no sorvete que, por sinal, não tinha vestígios de gelo, bocados mais sólidos, nada. Cremoso e fresquinho, a cortar o doce do pudim, que era uma pequena almofada de aconchego de tão fofo que era. Doce e encorpado, mas ao mesmo tempo, tão leve!

E nós a pensar que chegava ao fim a jornada, eis que entra a última sobremesa: a Tangerina! Sumo de tangerina congelado com espuma de tangerina por dentro (a Tangerina em si), acompanhada com sorvete de tangerina e, por baixo, creme de tangerina (tipo um lemon curd mas de tangerina). O crocante não nos foi explicado mas, pesquisando outras reviews pela Internet, percebi que são cogumelos porcini desidratados e triturados (fonte: mafaldaagante).
Mais uma vez, a minha perdição por citrinos foi ao céu. O sumo congelado em nada se parece com o típico gelo, mais suave, mas congelado ao mesmo tempo. Oh meu deus, às vezes é mesmo difícil de explicar!
E a espuma por dentro, uma nuvem densa mas leve de aromas e sabores fortes a tangerina. O sorvete, tal como o de framboesa, uma cremosidade extrema e puxando pela parte mais ácida da tangerina, que complementava o doce da espuma.
Para mim, um dos maiores pontos altos desta aventura!

Para completar este ciclo, o cafezinho no fim. Estávamos um pouco receosos porque, na vez em que fomos ao Cantinho do Avillez, a refeição foi muito boa, mas terminou-se em tragédia com um café super queimado... E sabemos que não é qualquer pessoa que tira um bom café...
Mas os receios dissiparam-se quando o café chegou e, apesar de ter de levar açúcar à mesma (demerara), estava bem melhor. Fomos ainda mimados com uns docinhos para terminar a refeição em festa. Da esquerda para a direita: Praliné, goma de azeite, Framboesa com wasabi, Marshmallow e crocante de amêndoa com Petazetas (Estão a ver aqueles estalinhos doces que comíamos em pequenos?).
Bem, que delícias! Nenhum ficava atrás do outro! O chocolate a derreter na boca, o marshmallow como uma nuvem de sonho, e a vivacidade das petazetas e o regresso à minha infância... que felicidade! Mas a goma de azeite foi a grande surpresa! Possivelmente misturada com limão, pelo seu sabor ligeiramente cítrico, mas docinho. Bem, que maneira tão boa de terminar a refeição!
E com isto, passámos duas horas a provar novos sabores, a ter novas experiências e sensações. Não só a comida, como toda a envolvência, o seu aspecto, o que nos provocam... Que jornada mirabolante em apenas duas horas!
E não, não ficámos com fome. Não ficámos empanturrados (Também penso que nunca deve ser esse o objectivo), mas com fome não!
Definitivamente, uma experiência a repetir, mas só daqui a uns aninhos porque, apesar de tão bom, para a carteira nem por isso.
Mas aconselho a todos os que quiserem ter uma experiência diferente, com contrastes que se complementam, com comida que é linda não só para a boca, mas para todos os sentidos.
Merece, definitivamente, as duas estrelas Michelin que tem!
Restaurante Belcanto
Largo de São Carlos, 10, 1200-410 Lisboa
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